Final de ano é sempre a mesma coisa: “promoções imperdíveis de Natal” e bombardeio de propagandas sentimentais na televisão que mostram famílias felizes comprando ou trocando presentes, num clima que favorece o consumo. E aí começam os shoppings lotados, a euforia de quem deixou as compras para a última hora, a infindável lista de presentes para os amigos e familiares e aquela angústia por não saber se o dinheiro vai dar para tudo isso. Somos atingidos por uma onda de consumismo quase obrigatória, alimentada pela mídia e assumida por toda a sociedade, que se repete a cada data especial (Dia dos namorados, das mães, das crianças), ou mesmo na rotina diária.
Para a socióloga Valquiria Padilha, autora do livro “Shopping Center: a Catedral das Mercadorias”, é crescente o número de pessoas que colocam o consumo no centro de suas vidas. “Vira um círculo vicioso em função de consumir mais e supostamente ser mais feliz. Existem inúmeros estudos que mostram que não há relação entre consumir e aumentar a felicidade. Há apenas a ilusão dessa relação alimentada pela publicidade. Comprar causa uma sensação imediata de segurança, pois aprendemos a projetar nossas inseguranças naturais nos bens materiais, nas marcas, na quantidade de coisas que acumulamos e descartamos cada vez mais rapidamente.”
Mas você já parou para pensar em por que escolhe determinada loja, aquela lanchonete específica ou por que seu filho e todas as outras crianças cismam sempre com o mesmo brinquedo? Será que as vontades que temos realmente nos pertencem?
Em 1957, o norte-americano James Vicary, especialista em marketing, criou o conceito da mensagem subliminar: um tipo de propaganda ou mensagem que não pode ser percebida pelo nosso consciente, mas que fica marcada de alguma forma no inconsciente. Na época, para comprovar sua teoria, Vicary inseriu frases como “Eat Popcorn” (coma pipoca) em frações de segundos durante a exibição de um filme no cinema. Nas noites em que as frases foram projetadas, ele disse que as vendas de pipoca aumentaram 57,7%. Alguns anos depois, porém, Vicary assumiu ter falsificado os números das vendas, mas, ainda assim, vários países proibiram a prática e em 1974 a Organização das Nações Unidas (ONU) anunciou que o uso de mensagens subliminares é uma ameaça aos direitos humanos.
Sadores da University College London, na Inglaterra, divulgaram um estudo que confirmou que as pessoas são realmente capazes de registrar mensagens subliminares, principalmente as negativas. Nos experimentos, a cientista Nilli Lavie mostrou aos 50 participantes uma série de palavras em um computador. Cada uma aparecia por um tempo tão pequeno que não permitia que a pessoa lesse a palavra conscientemente. Os substantivos e adjetivos usados eram positivos (alegre, flor, paz), negativos (agonia, desespero, assassinato) ou neutros (caixa, orelha, chaleira). Depois, os participantes tinham de dizer se a palavra que viram era neutra ou tinha impacto emocional (positivo ou negativo). Os pesquisadores constataram que as pessoas tendiam a responder com mais precisão após serem expostas a palavras negativas, mesmo quando acreditavam que estavam apenas chutando suas respostas.Recentemente, pesquiÉ possível que estejamos agora mesmo comendo hambúrgueres ou comprando coisas supérfluas da mesma forma que essas pessoas imaginaram adivinhar as palavras. Não influenciados de forma exatamente subliminar, mas convencidos por um processo utilizado pelas propagandas que usam vários atrativos quase imperceptíveis. Cores, formas, músicas e odores são minuciosamente pensados para que compremos cada vez mais. Vários estudos mostram que músicas agitadas nas lojas fazem com que se compre mais e mais rápido. Na outra mão, músicas tranquilas seguram o consumidor por mais tempo. Luzes e cores também têm suas funções: o vermelho estimula o apetite e o azul acalma, por exemplo.
Segundo o designer e publicitário Paulo Mutza, há várias etapas na criação de uma marca. “Primeiro se faz uma imersão no universo do cliente e do consumidor por meio de uma pesquisa.
Depois, entra o processo de criação do nome e, em seguida, o desenho da marca em si.” Tudo com cuidado para que o cliente se identifique com aquele logotipo. Os símbolos de marcas internacionalmente conhecidas como Nike e McDonald’s, por exemplo, são reconhecidos à distância em qualquer parte do mundo. Outros, além de conhecidos, passam, de forma sutil, uma mensagem sobre a marca. É curioso observar, por exemplo, que o logotipo da empresa de entregas Fedex contém uma flecha quase imperceptível entre as letras “e” e “x” que, mesmo sem o cliente percebê-la, remete à rapidez. “A mídia faz uso de uma série de técnicas psicológicas para atrair o cliente e fazer com que sinta prazer em estar naquela loja ou com aquela marca. E a sociedade consumista cria necessidades supérfluas. Por que você tem de trocar de celular o tempo todo, com 300 mil funções se você só o usa para ligar?”, questiona a psicóloga e psicoterapeuta Olga Tessari.
Mariana* é dessas pessoas que consomem sem saber o porquê. “Acordo ‘namorando’ alguma coisa. Uma bolsa, um sapato. Quando vejo algo que gosto na televisão, corro para a internet para pesquisar preços.” Ela conta que entra em desespero quando o assunto é contenção de despesas, mas que não consegue se controlar. “Me sinto culpada depois de comprar, principalmente quando é algo inútil. Mas a culpa dura só até a próxima compra”, confessa.
Para a socióloga Valquiria Padilha, a solução para esse consumismo desenfreado é simples: “Temos que aprender a encontrar felicidade, prazer e satisfação, ainda que momentâneos, de outras formas”.
*Nome fictício
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